A Letra Mata?
Desfazendo o Mito com Base em 2 Coríntios 3:6
Márcio Rodrigues
"O qual nos fez também capazes de ser ministros de um novo testamento, não da letra, mas do espírito; porque a letra mata, e o espírito vivifica."
(2 Coríntios 3:6 – ARC)
A frase “a letra mata” é frequentemente usada para criticar teólogos, pregadores expositivos ou estudiosos da Bíblia, como se o conhecimento bíblico fosse prejudicial à fé. Mas..
- Será que é isso mesmo que Paulo quis dizer?
- O apóstolo estava condenando o estudo profundo da Palavra?
Vamos entender o contexto, o propósito e a intenção do texto, de forma honesta e fundamentada.
O autor é o apóstolo Paulo, homem de grande formação intelectual e espiritual.
Formado aos pés de Gamaliel (At 22:3) e chamado diretamente por Jesus (Gl 1:12), Paulo é o maior teólogo do Novo Testamento, defensor da fé cristã e da sã doutrina.
A carta foi escrita à Igreja de Corinto, uma comunidade cristã em uma cidade grega cosmopolita, imoral e cheia de conflitos internos.
Os crentes ali enfrentavam divisões, desvios doutrinários e legalismo.
Paulo escreve para:
- Defender sua autoridade apostólica
- Explicar a superioridade da Nova Aliança
- Mostrar que o ministério do Espírito supera o da letra da Lei
O que significa “a letra mata”?
Muita atenção aqui:
"Letra" não é “estudo bíblico” ou “teologia”.
"Letra" refere-se à Lei de Moisés, escrita em tábuas de pedra.
A Lei, por si só, revela o pecado, mas não transforma. Por isso, condena o pecador (Rm 7:10–13).
A letra mata porque ela expõe o pecado sem dar poder para vencer o pecado.
Já o Espírito — que opera na Nova Aliança — vivifica:
Ele convence, regenera e santifica.
Ele aplica a graça de Deus ao nosso coração.
- Ele não está condenando o conhecimento bíblico.
- Ele não está dizendo que estudar teologia é errado.
- Ele não está opondo "letra" (estudo) ao "Espírito" (revelação).
O próprio Paulo escreveu cartas doutrinárias profundas como Romanos, Gálatas e Efésios.
Ele recomendava examinar as Escrituras (At 17:11) e pregar com fidelidade (2 Tm 4:2).
Muitos usam essa frase como desculpa para:
- Desprezar o ensino bíblico sólido
- Atacar estudiosos e pastores sérios
- Justificar revelações místicas sem fundamento na Palavra
Mas isso é um erro teológico grave.
Paulo está tratando da diferença entre a Lei e o Evangelho, e não da oposição entre estudo e Espírito.
O próprio Jesus ensinava com base nas Escrituras. Ele mesmo disse:
“Errais, não conhecendo as Escrituras nem o poder de Deus.” (Mt 22:29)
A verdadeira espiritualidade se apoia na Palavra e no Espírito. Um não anula o outro — eles se complementam.